Cyberbullying. Facebook combate fenómeno que só 7,9% dos estudantes admitem ter sofrido
Notícia do i de 9 de Dezembro de 2013.
Por Diogo Pombo
Investigadores dizem que só em último caso as vítimas optam por contar o problema a pais ou a professores
Seja por culpa de uma piada pouco simpática ou de uma fotografia em tom de gozo. Além de ser a rede social mais popular no mundo – mais de 1,2 mil milhões de utilizadores -, o Facebook também se pode transformar num pesadelo para qualquer adolescente e é um dos palcos preferidos do cyberbullying. Um estudo da própria rede social descobriu que apenas 20% dos adolescentes confrontaria o seu “bully” se tivesse de redigir a mensagem. Daí a recente decisão do Facebook: criar ferramentas automáticas para confrontar o agressor e os vários casos em que este problema se pode concretizar.
Inês estava apaixonada. O namoro durava há meses e tudo parecia correr bem. Quando as saudades eram muitas enviava fotografias suas a Pedro. Imagens onde se via pouca roupa e muita pele. As discussões apareceram e com elas vieram os problemas. Inês decidiu terminar o namoro e as fotografias que tinha enviado antes começaram a aparecer no Facebook – Pedro decidira vingar-se. Os nomes são fictícios mas a história serve de exemplo para o tipo de episódio que João Amado por várias vezes já assistiu na realidade. “São os casos mais graves e os que mais me chocam”, confessou ao i o investigador da Faculdade de Psicologia e Ciência da Educação, da Universidade de Coimbra.
Por cá, este tipo de episódios é o mais comum quando a conversa toca no cyberbullying: “Isto acaba por ser violência entre namorados”, classificou o docente, ao retratar uma “prática” em que “as raparigas enviam fotografias íntimas” numa “situação de confiança mútua”, e que depois acabam “por ser utilizadas como armas de vingança”. Em Portugal, porém, o fenómeno ainda é pouco estudado – e, pelos números, também ainda pouco expressivo. Entre 3525 adolescentes que frequentavam o 6.o, 8.o e 11.o anos, inquiridos em escolas de nove distritos do país, durante 2013, apenas 297 (7,9%) admitiu já ter sido alvo de cyberbullying.
Esta é uma das conclusões do “O Cyberbullying nas Escolas Portugueses: Um Desafio à Promoção da Literacia Mediática”, trabalho elaborado pela Universidade de Coimbra e financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), a que o i teve acesso e que será divulgado em breve. A reduzida prevalência do fenómeno, suspeita João Amado, poderá dever-se à reacção “mais normal” das vítimas de cyberbullying: a de ficarem “calados” e “guardarem as coisas para si próprios”.
É esta atitude que o Facebook quer evitar com as suas novas ferramentas anti-bullying, que começou a implementar em Novembro. O objectivo passa por “ajudar os jovens a construir e manter relacionamentos”, pois isso “não acontece automaticamente”, defendeu Marc Brackett, do Centro de Inteligência Emocional da Universidade de Yale, nos EUA – uma das entidades que participou nos trabalhos para avaliar como a fricção nas relações afecta a vida online dos jovens.
Foi assim que o investigador justificou a criação de respostas automáticas no Facebook, na quinta-feira, durante a conferência do “4.o Compassion Research Day”, transmitida via streaming. A ideia foi construir uma lista de frases e abordagens, a serem escolhidas pelos jovens vítimas de cyberbullying, quando decidem entrar em contacto com os seus agressores. “O nosso objectivo é que os jovens respirem fundo e se lembrem de parar no momento em que vão reagir [ao cyberbullying]“, revelou, ao mesmo tempo que lhes confere “ferramentas para pensarem no impacto do que o que dizem pode ter na sua reputação online”. E, claro, para resolver casos de cyberbullying.
O Facebook descobriu que apenas 20% dos adolescentes confrontariam o seu agressor se tivessem de escrever o que lhe vão dizer. E 73% dos utilizadores que publicam conteúdo ofensivo respondem sempre que são contactados, afirmam os estudos conduzidos, no último ano, pela rede social norte-americana. “João, esta publicação é ofensiva e deixa-me muito desconfortável. Podes eliminá-la por favor?”, foi um dos exemplos de mensagem pré-formatada, apresentados por Mark Brackett, que será sugerida aos jovens no momento em que reportam um post e decidem confrontar o utilizador que o publicou. Para lá das respostas automáticas, o Facebook construiu também um portal com explicações e conselhos, dirigidos a pais e professores, a adoptar na hora de lidar com vítimas e agressores.
João Amado saudou a iniciativa, elogiando-a como “extremamente positiva”, embora ressalve que o mais frequente é os jovens “calarem-se e esconderem- -se”. Uma reacção inata ao próprio cyberbullying, explica o investigador, que “muitas vezes” tira proveito “da situação de anonimato” dos agressores e o subsequente silêncio das vítimas. Quando de facto falam (38,9% dos adolescentes simplesmente apagam ou excluem o contacto do bully), o mais provável é que as queixas acabem em ouvidos de amigos – aconteceu em 35,9% dos casos em Portugal, segundo os jovens inquiridos no estudo da Universidade de Coimbra. Só 27% dos participantes afirmaram ter contado as agressões aos seus pais.